Pode ter sido coincidência, mas prefiro acreditar que foi o desacreditado destino o responsável por justamente hoje eu não me caber de tanta saudade e, olha só, ser o seu aniversário, a menina que me fez sentir saudade pela primeira vez. Resolvi, então, te escrever. Assim, meio como uma troca de palavras entre dois desconhecidos que se conheceram na infância e cuja lembrança, da minha parte, remete à maiô vermelho, chinelos e a esquina que ainda é o fim da rua em resido. Resolvi te escrever meio que como para fazer sair aqui de dentro como eu, em tão tenra idade, lidei com aquela saudade que me era tão latente. Acredito que temos muito a aprender com as crianças. Inclusive aquela que nós fomos.
É que eu vou sentir saudade de novo, sabe? Aquela mesma saudade, talvez menos inocente, mas tão dura quanto. Porque precisarei me despedir de vícios, costumes, coisas e pessoas que ou não me fazem bem ou não pertencem mais ao meu lugar. Hoje é seu aniversário e imagino que você seja daquelas pessoas que considera essa data o verdadeiro ano novo a trazer novos desejos, novas metas, novos sonhos e novas realizações. Então você sabe do que eu to falando. É difícil, né? Dar adeus sem querer, porque é necessário. Ou estou eu sendo por demais dramático? Ou, pior, será que estou perdendo a compostura racional que um jovem de vinte e seis anos – quase vinte e sete – já deveria ter perante a vida?
Eu lembro que sofri nos primeiros dias. A menina do maiô vermelho nunca mais apareceu no clube durante as aulas de natação. A menina do maiô vermelho, na verdade, nunca mais apareceu em qualquer outro lugar se não única e exclusivamente na minha memória. É uma lembrança boa, gostosa de lembrar sempre que nos encontramos. Como disse-me uma vez uma amiga, “é bom se reconhecer em outra pessoa. Sem essa de se sentir completo, só reconhecer mesmo”. Eu enxergo um garotinho tão puro e inocente quando me reconheço em você, que até peço desculpas por bater sempre nessa tecla e ficar lembrando disso e te escrever do nada e e e... Mas é que eu fui notificado do seu aniversário e justo na hora em que pensava sobre o quanto já parecia estar sentindo saudade antes mesmo de dar adeus.
E então eu percebi. Acabei de perceber, quero dizer. Não lembrei como consegui vencer aquela saudade, mas enquanto escrevia pra você eu percebi que não era para a menina do maiô vermelho que eu escrevia. Era pra mulher Lorena, desbravadora de outras fronteiras que à casa torna porque, sim, algumas dessas lembranças vão continuar sendo presente passe o tempo que passar sem importar quantos quilômetros distante se está. Percebi que escrevia pra você – pela segunda vez – mesmo depois de você ter me dado adeus tantos anos atrás. Nosso adeus não retroage, portanto não leva nossas lembranças. E são elas que acalentam essa saudade que fica depois da despedida.
Saudade aliviando saudade, quem diria. Acredito que foi isso que, sem que eu percebesse, me conduziu por dias até que eu já não me lamentasse mais por você ter ido embora. Chega um dia que ou a gente segue em frente ou vira um poço de lamúrias esquecido nos fundos de um sítio. É esse poço que a gente vai deixando de alimentar com o passar dos anos, a cada novo ano que, tal qual você hoje, damos as boas-vindas. Dar dois passos para trás é, por vezes, assumir nossa fraqueza para fazermo-nos mais fortes. Talvez despedir-se seja como exteriorizar pelo menos um pouquinho de orgulho por quem somos e, mais ainda, desejamos ser. Eu não sei se um dia podermos definitivamente dizer que chegamos onde queríamos chegar, mas espero que, assim como eu farei todo o possível pra que isso aconteça comigo, você esteja no caminho que deseja estar.