terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

James Joint


Sempre foi realmente muito confuso pra mim o fato de um beijo, aquele primeiro de todos, ter dado origem ao sentimento que tão serenamente me preenche e que eu sinto por ti. Don't know why, just know i want to. No fim das contas eu não sei mesmo porquê, só sei que eu quero você. Quero você com todas as forças do meu corpo, porque - enquanto conversávamos ontem e eu te ouvia dizer que talvez fosse coisa do destino mesmo - acabei percebendo o quanto viver a realidade de um antigo sonho impossível torna possível outras coisas inimagináveis acontecerem. Flutuar, por exemplo. E ontem você me fez flutuar mais de uma vez.

Talvez eu não recorde a quantidade exata de vezes, mas não precisaria mais do que a lembrança de uma única delas para a noite de ontem ficar na minha história como um dos capítulos mais lindos, incríveis e surpreendentes que eu pude ver escritos. Você me fez flutuar várias vezes e todas aquelas de que me recordo vem com teu sorriso como a última lembrança antes de meus pés ficarem suspensos no ar. "Dá um beijo", você disse depois de ouvir alguns dos anseios confusos da minha mente. Deu um sorriso, fechou os olhos e foi aproximando teu rosto do meu, enquanto meu coração pulsava tão aceleradamente que eu quase não percebi estar com os pés fora do chão.

Kiss it, kiss it better, baby. Não te beijar sempre foi garantido, afinal - e te beijar nunca esteve no rol dos sonhos impossíveis, ainda que seja o beijo um dos carinhos mais presentes em todos eles. Mas não foi o beijo que me fez flutuar, ainda que eu não tenha sentido o chão sob meus pés enquanto te beijava. Talvez porque foi rápido, mas de certo que nunca terei tempo suficiente pra sentir qualquer gosto teu - e o fato de ter me conformado com isso faz com que, por mais efêmero que seja, eu aprecie qualquer momento dividido contigo. Te beijar enquanto flutuava já era pra mim como a chave de ouro que encerraria nossa primeira noite de carnaval, independente de quantas horas ainda restassem pro fim.

I don't wanna rush into it, if it's too soon. Sete anos daquele primeiro beijo. Sete anos de histórias entre beijos, abraços, reencontros, desencontros, camas, tramas e infinitos dramas que só a passagem do tempo foi capaz de me ensinar que às vezes a vida é daquele jeito mesmo e a gente nem sempre pode ter o que quer, mas só a mim cabe reconhecer o verdadeiro valor de tudo aquilo que já tenho. Preciso que você saiba: sete anos fizeram do tempo o meu adversário mais cruel. Por três vezes achei que te tinha por inteiro pra mim e no nosso penúltimo reencontro percebi que ser teu por inteiro me bastava: descobri novas músicas, ampliei meus interesses e, ainda que permeando pelo plano dos sonhos impossíveis, dei a um futuro junto contigo a prioridade ante outros objetivos. 

Quase um ano desencontrado de ti, receoso de te encontrar enquanto era ao meu encontro que você queria ir também. I don't even really care about you no more. Você me perdoou pelo abandono quando eu ainda nem sequer tinha tido a hombridade de pedir perdão. Up against the wall we don't need a title. Sete anos de histórias rotuladas pelo conhecimento de uns, pelos olhos de outros e ouvidos de alguns poucos. Por três vezes eu vi você partir e acabei partindo quando confundi teu jeito de amar com falta de amor. Mas o que tua libido tem de selvagem, tem de estranho o nosso coração. E o teu, bem, em breve nosso primeiro beijo completa uma década e eu tenho certeza que, não importa quantas décadas se passem dele, teu coração nunca deixará de ser estranho pra mim.

Você tem seus demônios e eu tenho meus arrependimentos. O tanto que eu imagino que seja difícil pra você planejar o futuro ao lado de outra pessoa que não quem esteve toda a vida do teu, é o tanto que eu me arrependo de ter deixado a vergonha adiar nosso último reencontro - que assim pra sempre seja - e eu sinceramente não sei como fiquei tanto tempo sem te abraçar, te sentir, te fazer cafuné. Man, I know that it's hard to digest, but baby this love is so different from the rest. And I know it seems hard to accept, but you've got to do it. Eu tenho meus arrependimentos. Nenhum deles é você.

Você me fez flutuar, sentir por dentro um vazio que só estando no meu lugar pra compreender o quanto de amor pode caber num espaço aparentemente cheio de nada. Eu penso demais e talvez por isso vez ou outra me encontre também cheio demais, coisas do meu mundo e de mundos outros, que são mais como água de banheira que uma poça d'água no meio da rua: melhor abrir logo o ralo que esperar evaporar. Come back to me, so I can feel alive again. Entre beijos, olhares, voz e gestos carinhosos, antes de preencher de amor o vazio, tinha aquele sorriso. Corpo e alma uma coisa só. E eu flutuava. What do I gotta do to get in your motherfuckin’ heart?

É realmente muito confuso, mas o que aconteceu comigo depois daquele primeiro beijo talvez seja mais inexplicável que carente da escolha entre motivos racionais ou emocionais. Que mal há em ter na vida algo que não careça de explicações? Com você eu vivo novas experiências, experimento novas sensações e sinto o mesmo coração acelerado enquanto por dentro meu corpo treme, seja recebendo um afago, seja pela forma que você diz me amar nesse idioma que só entende quem aprende a te escutar além da voz. E enquanto alguns acreditam na sensibilidade como uma característica de todos os seres vivos, outros não conseguem compreender a recíproca de um sentimento como aquele que sente.

You take me higher, higher than I've ever been, babe. Você me fez flutuar e não me importa se foi por causa do amor que eu sinto ou pelo fato de ainda hoje por ti ser apaixonado. Não me importa se era o álcool na tua cabeça ou aquele sorriso. Anos se passaram desde aquele primeiro beijo até esse agora e eu já quis muito que ele não tivesse existido, porque cada partida sua foi dolorosa. E doeu muito até que eu conseguisse compreender que era aquela dor muito mais culpa da minha carência que prova de desprezo seu. Você foi embora sem dizer adeus e eu acreditei que havia conseguido dizer por você. Mas cada partida sua era dolorosa até o reencontro seguinte. Bastava diminuir a distância para que aumentasse a velocidade dos meus batimentos cardíacos e a intensidade do que desde aquele primeiro beijo começou a crescer dentro de mim.

But I'm in love, can't blame me for checking. Afinal que mal há em ter na vida algo que não careça de explicações? Acontece que o que aconteceu depois daquele beijo tem, sim, uma explicação: eu me apaixonei repentina e, o mais louco, perdidamente por você. E o fato de me importar mais com meus pés fora do chão que com o por quê de me sentir assim não isenta de existência um outro motivo possível e real: o primeiro beijo, o prefácio do que eu chamo de minha história com você. I look in your direction, hoping that the message goes. Foi quando tudo começou, com teu beijo inexplicável, a única explicação pro teu corpo ser meu maior desejo, conquistar teu coração ser meu maior anseio e minha alma ter na tua seu ponto de equilíbrio.

Ontem você sorriu, eu flutuei e te ouvi dizer sobre nós, não mais sobre eu e você. Foi aí que perdi as contas, porque não acreditava ser você quem primeiro falava sobre planos futuros, dividir uma casa e ir pra cama todos os dias, contrariando meu atual estilo de vida de solteiro com Netflix em casa. Mas é que, além de inexplicável, aquele primeiro beijo também fez de ti a minha maior exceção às regras. Somewhere close to you. Quando parti, teus cabelos já eram meus, mas levou um tempo daquele primeiro beijo até que eu me atrevesse ao primeiro cafuné. E você já era exceção de muitas das minhas regras, então talvez dar vazão àquela vontade quase incontrolável de te beijar não fosse aconselhável - por querer mais e mais e mais e mais elevado à potência máxima, e não poder ter no segundo a seguir.

Eu já tinha descoberto: ter aquela amizade pra vida inteira podia ser ainda melhor que te ter por inteiro. Close to you. Com a amizade acabei descobrindo o quanto eu realmente te amava. E o quanto eu já tinha perdido tempo querendo algo que só o futuro iria me permitir ter ou desencanar de vez, deixando de lado o que tinha no presente como certo. E ainda que fosse essa uma regra geral, seria você a exceção se o amor nunca pudesser ser o bastante. Mas, sim, às vezes o amor não só é o bastante como só o fato de amar alguém ou alguma coisa já é suficiente também. Só sentindo pra não só compreender como entender o que é. If you let me, I'd be there by now. Quando te amar me bastou, eu joguei a toalha do querer e pude sentir teu amor.

Eu não flutuei, mas teu amor veio e quando o senti era a primeira vez que um sonho contigo se atrevia a aventurar-se no além muro das impossibilidades pra se tornar realidade. Eu nem precisava flutuar, na realidade; aquilo já era incrível só pelo fato de estar acontecendo. Quando eu deslizei os dedos pela tua cabeça a primeira vez, descobri o quanto aquele cafuné era também o nosso momento mais íntimo - mais até que qualquer uma daquelas vezes que precederam suas partidas. Eu quis um beijo teu como sempre quero e talvez nunca deixe de querer. Mas entre sua última partida e aquela minha, acabei descobrindo naqueles cafunés algo que até então me era inimaginável - e que mesmo depois de ontem continuo achando tão ou mais incrível quanto flutuar: passear com as mãos pelos teus cabelos é como te beijar. Close to you.

Aquele primeiro beijo foi semente que germinou e espalhou-se por todo meu corpo. O primeiro beijo, inexplicável, mas - pra qualquer que seja a pergunta - a melhor explicação. Eu te quero com todas as forças do meu corpo. E talvez querer teu beijo seja uma exceção à regra dos pra sempres que acabam. Teu beijo eu quero até quando já tenho. É assim desde o primeiro. E eu quero teu corpo colado no meu, quero sentir teu coração acelerado de saudade depois de uma viagem e quero casar contigo. Eu já tinha em mente alguns dos nossos dias, em casa ou apartamento, com filhos ou só curtindo com nossos sobrinhos; mas ontem, ao te ouvir dizer pela primeira vez todas aquelas coisas pra mim, o futuro foi a última coisa sobre a qual eu pensei. 

Sempre foi realmente muito confuso pra mim o fato de um beijo ter dado origem ao sentimento que tão serenamente me preenche e que eu sinto por ti. E, não só isso, aquele primeiro beijo influenciou em muitas das direções que eu segui nos últimos anos. Eu lembrei de muitas direções erradas, lembrei de atalhos que quis pegar e da dificuldade que é andar pela direção certa, mas sempre cheia de obstáculos. Vieram momentos bons, momentos sofridos, dores e tantas vezes que dar vazão à minha vontade tinha dos outros um certo desprezo. E vieram as lágrimas. Um choro tímido, marejando os olhos incrédulos em ter você na minha frente falando tudo aquilo. Um choro de quem reconhece a impermanência daquela sensibilidade, mas vê no teu sorriso a melhor prova que não te falta a verdadeira essência. Um choro inevitável quando a realidade se faz presente de algum sonho que acreditamos impossível. Que traz junto dele uma sensação esquisita, como se misturasse plenitude, alegria, surpresa e satisfação numa coisa só e esse sentimento sem nome só não fosse maior que meu amor.

Eu quero casar contigo. Quero que esse diariamente vire dia-a-dia da noite pro dia como aquele primeiro beijo me fez apaixonar por você. Quero ser o motivo do teu sorriso a cada amanhecer. Dois corpos, duas almas, dois corações e um futuro em que eu possa ser mais teu companheiro que tua companhia. Você é minha exceção e pra estar contigo só o amor me basta. Ontem eu não pensei sobre futuro, porque precisei relembrar do passado e agradecer única e exclusivamente por aquele presente. Hoje eu pensei muito sobre você, sobre como cheguei até aqui e sobre onde eu não só quero chegar, como você me inspira a caminhar pra chegar. E você me fez flutuar, sabe? Toda vez que eu te beijo é como se fosse a primeira vez, mas ainda não houve nada além do teu beijo que se perpetuou na memória, e sempre que acontece novamente faz o coração bater na mesma intensidade acelerada como se nunca tivesse acontecido.

Ontem não só foi a primeira vez que você me fez flutuar, mas a primeira em que eu flutuei e, se não me for possível ter isso de novo, de certo que outras coisas virão ainda pela primeira vez me encantar.
Eu nunca havia imaginado que te fazer cafuné seria como te beijar. E toda vez que eu te beijo é como se fosse a primeira vez.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Não contem comigo



Não contem comigo pra nada, estou saindo da lama. Alheio à beleza, às vestes velhas, à falta do cansaço e às incansáveis tentativas eivadas de frustração. Alheio, principalmente, ao medo que me tomou conta tantas incontáveis vezes. Parei de querer ir mais alto, preferi sentir o chão sob meus pés e, não contem comigo, acabei por perceber que eu teria que dar meus primeiros passos na lama se quisesse realmente voltar a caminhar. Estou saindo da lama e percebi que quanto mais alheio ao mundo de fora eu fico, mais leve e próximo de terra firme meu corpo se encontra. Então não contem comigo pra nada, já é difícil suficiente manter o equilíbrio tendo que lidar com a falta de medo que não me deixa descansar.

Que falta faz o cansaço. Mas que falta faz mesmo a beleza, alheia à todo o resto, disposta ao sacrifício de incontáveis anos que dariam-lhe novas vestes em nome dos anos de agora que, estes sim, não à toa chamam-nos presente - um tempo de graça que a nada se assemelha ao tal futuro que promete o novo, mas só chega e se faz novidade num hoje como esse aqui. Hoje estou saindo da lama, como um dia estive no passado e não espero continuidade se existir o futuro. No presente de um amanhã, quando talvez possam contar novamente comigo, espero que meus passos tenham na lama só um rastro seco - marca de um agora no passado a lembrar quanto tempo levou pra que eu saísse de lá.

Então não contem comigo, estou saindo da lama e a quantidade de passos a marcar um agora no passado nada me dirá do tempo que levei entre hoje e o primeiro deles em terra firme. Serão sempre tantos passos, mais ou menos tempo entre um e outro. Alheio a tantas infinitas coisas, dentre elas de certo que não está o tempo. Não posso ser indiferente ao tempo, porque - diferentemente da beleza, das vestes velhas e qualquer coisa incansável que me canse - o tempo não é indiferente a mim. Que falta faz o cansaço, mas - mais ainda que a beleza - que falta faz não perder mais tempo. E não posso perder tempo logo agora que estou saindo da lama, então não contem comigo.

Não contem comigo pra nada, estou saindo da lama.

Cafuné

 

Você sorri com os dedos enquanto eu acaricio teus cabelos num vai e vem desgovernado, que minhas mãos não conseguem controlar velocidade e direção ao mesmo tempo, porque é mais ou menos isso que encostar na tua pele faz comigo aqui dentro: distrai, descontrola, apaixona. Você sorri e eu te amo, mas me apaixono ainda mais por você.

Uma das mãos no volante e outra indo à nuca e ao pé da orelha, que não são minhas, mas, sendo suas, a mim são entregues com a confiança que só tens em ti, e com a qual sorri de olhos fechados, só com o balançar da cabeça. O automóvel controlado é oposto ao que bate no meu interior à esquerda, tão longe de você: coração descontrolado, distraído, apaixonado.

Ruas movimentadas, envoltas no silêncio, desertas ou iluminadas; vira à esquerda, cruza, vira à direita ou arrisca o amarelo pra testar a atenção. Assim também se passaram os últimos anos e eu bem me lembro de como me foi arriscado desafiar tua atenção quando levei minhas mãos ao aconchego dos teus cabelos a primeira vez.

Coração acelerado, energizado pelo tocar na tua pele que meus dedos arriscam ao deslizar até o pescoço. É sempre uma primeira vez o jeito que você me faz sentir e - talvez as pessoas não saibam - é tão difícil pra mim quanto pro resto do mundo entender o porquê de ser sua a única pele capaz de me distrair, me descontrolar, me fazer apaixonar-se cada vez mais assim.

Eu te amo tem tempo. E é o amor que mantém em mim a serenidade quando ao volante estão minhas duas mãos, como todo o meu corpo a sentir falta da tua companhia. É o amor que, dentre todas as loucuras do mundo, se fez em mim a mais sã, para que eu pudesse hoje entender, ao te ver sorrindo com os dedos, que não existe tempo a se contar do quanto por ti eu sou apaixonado.

Eu me apaixono por você todos os dias. Se não é um calafrio inesperado, é teu jeito de dobrar os dedos da mão entre a cabeça e a almofada; se não é a surpresa de querer ser minha companhia, é querer a mim como sua companhia; se não é o abraço carinhoso na despedida, é o abraço carinhoso na chegada, e por aí vai: me distraindo, descontrolando e eu cada vez mais me apaixonando.

Não me importa - o que, por si só, devia ser motivo suficiente pro resto do mundo não se importar - entender o porquê da tua pele ser a única capaz de me fazer sentir assim. O fato é que, você e suas primeiras vezes, é a primeira vez que estar apaixonado me importa muito mais que ser feliz pra sempre no amor. A vida não é um conto de fadas, afinal.

Eu vejo sorrisos onde outros julgam não existir. Enxergo esperança até que a chama da vida tenha se apagado. Prefiro ler gestos a ouvir palavras ensaiadas e, exercitando diariamente, espero um dia me ver livre de todos os preconceitos. E pode ser que nunca mais eu me distraia, quiçá um dia eu perca tudo, menos controle. Não sendo a vida um conto de fadas, tenho você pra minha encantar.

Eu te amo tem tempo. Quando você me distrai é o amor que chama de volta minha atenção. Quando você me faz perder o controle, é do amor que extraio forças pra retomar a direação. E quando eu me apaixono por você, é amor o que sustenta nossa falta de perfeição. Eu te amo tem tempo. E não canso de me apaixonar por você todos os dias.

Isa, a bella

Era branca como a neve a menina. Quando a conheci, numa de minhas madrugadas atrevidas, faltava-me sobriedade para poder enxergar que nela reluzia o luar. Tenra idade ainda, mais da metade dos dedos de uma mão seus anos distantes de mim, não via eu que tal menina tinha nos olhos um brilho que só os esperançosos ainda insistiam em ter. Eu era um esperançoso e, entre conhecê-la madrugada e descobri-la amanhecer, custou um cadim de anos cujos meses por pouco não me fizeram perder a esperança.

Isa era o nome dela. Que menina de alma mais bela, e talvez fosse culpa da posição dos planetas e constelações no exato momento em que o mundo a recebera como um dos melhores presentes ao nascer. Gostava das estrelas, a menina. Estudava-as, desenhava-as em mapas que tinham as histórias de tantos outros presentes que o mundo receber - e alguns poucos que não eram tão presentes assim. Mas gostar de estrelas nem sempre é suficiente pra se fazer perceber tão bela no universo interior como o era do lado de fora.

A menina era bela, mas junto ao olhar carregava um bocado de tristeza que era dela, mas não tinha nela a origem. Aqueles que carregam o brilho dos esperançosos tem dessas dificuldades: não conseguem deixar que os tristes se afoguem em deseseperanças e, daqueles que encontram pelo caminho, levam qualquer tristeza que se aproxime do excesso. Era branca como a neve aquela bela menina, mas o mesmo luar que nela reluzia era cheio das sombras que só o amanhecer levava embora ao trazer um novo dia.

Eu pouco sabia das estrelas, mas de certo que Vênus tinha algo a ver com tudo de belo que por dentro e por fora aquela menina se fazia preencher: amor. Era feita de amor a tal Isa, que muitos de Bella insistiam chamar, sem sequer darem conta que não era pela voz que sua verdadeira beleza se extraía. Isa era bela, mas o que de mais belo ela tinha - além da beleza que, apesar da tristeza, há no brilho dos olhos cheios de esperança - era a inocência que só as almas puras como a dela tinham sem imaginarem possuir.

Isa, a bela. Branca como a neve, de alma pura e pro mundo um dos melhores presentes. Menina luar, ansiosa pelo próprio amanhecer para iluminar o universo interior de tantos outros que, como ela, insistem em ter nos olhos um brilho de esperança - era esta responsável por não deixá-la se afogar no excesso de tristeza alheio que vinha com as sombras tentar a pureza lhe tirar. Já não era de tão tenra idade como quando a conheci, mas mais da metade dos dedos de uma mão será distância imutável dos anos a nos separar.

Algumas distâncias são assim mesmo, tornam impossível um do outro se aproximar. Mas, primaveras à parte, soube a menina sentir o que os anos a mim se fizeram esclarecer: "tem sentimentos que só se vivem aos 15 anos, tem esclarecimentos que só surgem aos 50", ela disse quando eu já contava metade de um século, sem fé ou crença na existência de outros olhos que brilhassem como os dela. Estava esclarecido, afinal: se vivi aos quinze, poderia aos cinquenta recordar. E se a ebriedade impediu que visse nela reluzir o luar, a sobriedade foi o que permitiu que a esperança ela me fizesse enxergar.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Que venha a primavera


Um ano calado, de olhos abertos pra não te perder num piscar, e minha vista cansada ainda te reconhecia somente pela silhueta. Em meio a tantos outros do mundo, meu coração te escolhera de forma tão decidida que, além de te reconhecer numa sombra, eu não conseguira sequer me mover ao te ver virar as costas e começar a caminhar sozinho na direção que eu queria pra nós dois. Era reconfortante, eu assumo, ainda poder te enxergar quando nenhum outro sentido meu conseguia te alcançar.

Minha culpa acompanhou a inércia durante todo o tempo em que estive ali a te observar. E eu não conseguia entender o porquê de, se realmente havia me perdoado, você não me querer a seguir pela vida ao seu lado. Enquanto eu me questionava, minha vista cansava e ia ficando cada vez mais difícil minha consciência se sobrepor ao inconsciente. Até que, tal qual de tantas outras saudades suas, da silhueta ficou somente a lembrança. E deixar o passado pra trás não é uma de minhas características mais marcantes.

Eu não sei dizer por quanto tempo ainda me mantive forçando a vista tentando te encontrar, mas entre uma piscada involuntária e outra eu peguei no sono e você veio então me visitar nos sonhos. Tinha tanto tempo que eu não te via, mas os olhos fechados ainda mantinham a nitidez do teu rosto, do teu jeito, dos teus perfumes, do teu gosto e da tua voz. Foi assim que eu descobri o quanto sonhar pode ser perigoso às vezes: nos sonhos nunca há impossibilidade para o que queremos acordados. Se não tivermos cuidado acabamos nos perdendo por lá.

O fato é que eu te quis por muito tempo. Eu te quero há muito tempo, na verdade. Você foi um poder, que virou querer quando eu não podia mais. Então eu pude e eu quis, e quis mais e já não mais podia. Era sempre assim enquanto eu estava acordado, mas ao dormir você era todo meu. Eu te tinha comigo a dividir a cama, me salvando como herói, provocando meus instintos animais numa pista de dança, suprindo aquela vontade infinita de me amar como eu há tanto te amo. Não havia a impossibilidade do “nós” que a realidade me gritava.

É que não havia mesmo – realidade que ladra não morde, afinal. Não havia impossibilidade no "nós" e, enquanto eu te vi caminhando até perder de vista e antes de perder a vista, aquele tempo ia se fazendo perdido muito mais pra mim do que, momento ou outro, meu amor próprio quis que fosse pra você. O mundo é redondo, afinal. Não era pra longe que você seguia, mas na minha direção. De olhos fechados e perdido em sonhos e pensamentos eu não pude ver que ao meu encontro vinha a mesma silhueta que eu vira sumir.

Teu coração me escolhera de forma tão decidida que você tinha se disposto a dar aquela volta ao mundo sozinho, porque só assim eu descobriria que, pra caminharmos lado a lado, era preciso que caminhássemos sozinhos na direção do outro. E quando eu me calei, minha audição tanto se cansara da minha própria voz que o silêncio a existir entre eu e você se fez mais alto que a música deliciosamente desafinada que seus lábios cantavam e encantavam a distância que, ao contrário do silêncio, diminuía entre você e eu.

Eu estava dormindo, envolto na concretização inconsciente de tantos sonhos, desejos e vontades que por tantas vezes me dominaram o corpo, a mente, o coração. Eu estava finalmente dando vazão a todo o amor que tinha guardado no peito, transformando em sonho o que você nunca me dissera com todas as palavras ser a linha de chegada daquela solitária caminhada que, antes de pegar no sono, eu acreditei ter sido sua última partida. E, não fosse seu esforço e aquela melodia desafinada, esta realmente aconteceria e eu nem poderia me despedir.

Uma volta ao mundo implica em um mundaréu de obstáculos, desvios e alguns atalhos que despertam nossa curiosidade e vez ou outra podem nos fazer perder o foco, a lucidez, quiçá a vida. Você caminhou em linha reta, na esperança de que eu percebesse a tempo e fosse ainda mais rápido ao seu encontro, mas – sua tristeza, minha sorte – adormeci no mesmo lugar de onde você se despedira na última vez. Uma volta inteira no mundo e eu ainda não tinha percebido que bastava andar só um pouquinho pra trás que seguiríamos juntos pra frente?

Foi ainda em sonho que comecei a te ouvir cantando: quinta-feira, dia do nosso aniversário de namoro, você achou que eu iria gostar da ideia e me convidou pra comemorarmos no karaokê. Fiquei surpreso com o convite, mas aceitei de bom grado e eu nunca vou esquecer daquela noite, porque foi como se um sonho se transformasse num pesadelo pra se fazer realidade e eu perceber que não, o que a realidade me ladrava não era a impossibilidade, mas que só acordado eu teria a oportunidade de ser feliz.

Não bastasse a surpresa do convite, você me surpreendeu com alguns convidados criteriosamente escolhidos e aquele pedido de licença no microfone: disse que me amava e sabia o quanto alguns momentos tinham significados diferentes pra nós, mas que o mais importante era o significado que eu tinha pra você e todas aquelas pessoas que ali estavam. E eu tinha certeza que a seguir viria um pedido de casamento, não era possível que sua timidez se permitisse vencer por outro motivo.

Pelas portas entraram violinos ambulantes, numa melodia triste que eu acreditava ser mais por você conhecer meus gostos musicais e menos pela tristeza que se apossou de mim quando você cantou os primeiros versos e só conseguia te ouvir dizendo que estava desistindo de mim. E eu lembrei da despedida: um último abraço, minhas desculpas, seu perdão, você virando as costas, nossas mãos sem soltando no distanciar dos dedos e a distância se fazendo silêncio nos meus apelos pela tua volta sem qualquer reação.

Agora era eu quem não reagia, exceto pelas lágrimas que não consegui conter. E tua voz agora cortava o silêncio que eu não sabia nunca ter existido desde que me calara. Sua tristeza me ver adormecido, minha sorte essa tristeza ter atrasado um pouco a velocidade dos teus passos, mas momento algum obstruído a intensidade dos teus apelos para que eu acordasse a tempo de dizer qualquer coisa que te impedisse de desistir de mim. E eu acordei um verso antes de você cantar que estava me dizendo adeus, tão logo ouvi teu amor me chamando.

And I will swallow my pride, e de repente todo meu sonho se desfez. Um vazio onde antes mesas e cadeiras reuniam tantos outros que se importavam. Um vazio onde antes um palco e um pedestal te tinham tão próximos como tanto tempo eu já não tinha. You’re the one that I love, como eco eu ouvia se repetir enquanto atravessava pelas águas ferozes que se encontram entre consciente e inconsciente. E quando eu abri os olhos, nada. Tal qual antes de adormecer, você não estava ali nem como silhueta.

You’re the one that I love¸ eu ouvi e talvez fossem ainda os ecos do meu inconsciente tentando acreditar que aquele meu querer tinha razão de ser, porque já era um querer tão seu quanto meu. E a nitidez da sua voz estava mais para as cordas vocais que para as minhas lembranças. And I’m saying goodbye, resolvi seguir minha intuição auditiva e, vista ainda cansada, esfreguei os olhos consciente de que o mais provável era nunca mais conseguir tê-los em você. Às minhas costas tantos outros do mundo caminhavam nas mais diferentes direções.

Say something, I’m giving up on you, e ainda que o silêncio se sobrepusesse à cantoria, seria impossível não te reconhecer – agora a passos lentos – seguindo na minha direção. Eu estava sonhando? Você estava voltando? Por que eu me sentia como seu futuro estando num presente do qual você escolhera não fazer parte no passado? Em meio a tantas perguntas, percebi que na sua voz estava a resposta que eu procurava: conforme se elevava sua altitude, diminuía entre nós a distância. “Não desiste de mim”, eu disse baixinho e comecei a andar.

Se me deixasse perder novamente entre dúvidas e questionamentos, talvez fosse mesmo meu destino aquele que eu não queria, mas já esperava. Ficar parado ao te ver seguindo na minha direção era menos cuidar do jardim pra te ver chegar borboleta e mais me fazer camarão sonolento a perder-se depois de levado pela onda. “Não desiste de mim”, fiz dessas palavras meu apelo enquanto seguia na sua direção e já não era só a silhueta ou a voz se aproximando. Junto a você o perfume das flores, na mão uma rosa calejada pelas dores do tempo.

And I’m sorry that i couldn’t get to you, eu ouvi antes de acelerar mais o passo. Eu que lhe devia desculpas por não ter percebido antes. Eu que lhe devia desculpas pelo tempo que a culpa tinha me mantido inerte e não ter te alcançado antes. And anywhere, I would’ve followed you, e eu comecei a correr porque nem o cansaço dos meus sentidos me faria desistir daquele presente ou permanecer parado me lamentando por ser seu passado. Say something, I’m giving up on you, eu te ouvi cantar pouco antes de você perceber que eu tinha acordado.

“Não desiste de mim”, eu consegui gritar pela primeira vez e foi também a primeira vez que você me ouviu desde que escolhera aquela rosa pra te acompanhar no meu silêncio. Ela era como eu, afinal: desprovida de qualquer regra no manuseio, salvo cuidado e atenção, refém da passagem do tempo que transforma histórias em rugas e faz da morte nossa única eternidade. Meu grito se fez sorriso, e era o teu sorriso de felicidade, de esperança – de uma chance que, sendo primeira no amor e talvez última pra vida, eu faria de tudo pra ser a exceção na sua regra de arrependimentos.

Say something, I’m giving up on you. “Não desiste de mim”, você ouviu e abaixou a cabeça tão logo o sorriso escapou pelos lábios. Olhou para as pétalas que ainda se mantinham agarradas ao botão, desgastadas pelo tempo e de firmeza aparentemente fragilizada, e acreditou num encontro onde ainda nos fosse possível aguá-la e suprir-lhe com os nutrientes necessários para sua sobrevivência. Eram poucas pétalas, você sabia, mas a sobrevivência da rosa dependia menos de sua beleza no presente e mais do quanto ela ainda podia ser bela no futuro.

Eu nunca fui muito bom em adivinhar pensamentos e, se tratando de você principalmente, não fosse aquele sorriso entre me ouvir e olhar a rosa, eu talvez pensasse que a cabeça abaixada era decepção. Mas eu conhecia aquele gesto, de certo que como ninguém. Era teu sorriso mais sincero, teu jeito acanhado de exteriorizar o que três palavras jamais conseguiriam expressar de forma mais intensa: eu te amo. Então eu não sabia exatamente o que você pensava naquele momento, mas me era suficiente no teu gesto saber reconhecer o teu sentimento.

Say something¸ findava a canção quando nossos dedos se tocaram então pela primeira vez desde quando você partira naquela caminhada solitária. “Não desiste de mim”, eu disse baixinho em seu ouvido tão logo nossos corpos se uniram num abraço. “Eu não vou desistir de você”, eu te ouvi dizer e era tão real quanto o que meus olhos viam; tão real quanto teu cheiro misturado ao perfume do meu desodorante preferido; quanto o toque dos teus dedos, o abraço apertado e teu peito colado no meu; quanto o sabor do beijo que nunca se perdeu.

Restava na rosa uma única pétala, que eu mesmo fiz questão de arrancar. Se era a rosa como eu, precisávamos ambos nos livrar de tudo o que nos impedia florescer mais belos e fortes. Como aquela pétala haviam ainda muitas coisas presas a mim que inevitavelmente iriam perecer com o tempo. Dentre elas nenhuma impossibilidade carecida de sonho para tornar-se real, nenhuma possibilidade eivada apenas da voluntariedade do tempo, fazendo da minha vontade o único obstáculo entre aquilo que é impossível e como fazê-lo deixar de ser.

Enquanto construía minha crença na sua partida ia perdendo dos sentidos a sensibilidade e, pouco a pouco, acabei entregando à minha inconsciência tudo aquilo que, consciente, eu almejava pra mim. Fiz dos sonhos realidade e, confesso, tanto tempo navegando nas águas turvas do meu inconsciente tornou-me mais covarde e menos determinado. Tantos sonhos salvos das minhas incertezas permanentes e agora via tua impermanência sentimental viciada pelo amor que – não adianta negar aquele sorriso – você sente por mim.

Foi assim que eu descobri o porquê de me sentir como seu futuro e o quanto isso nada tinha a ver com não estar no meu presente pelo que já tinha ficado no passado. A mania de passado era minha e tua lembrança fez da memória o lugar onde você nunca deixou de existir no meu presente. Inerte, distante, calado ou inconsciente eu nunca desisti de você, das histórias que vivemos e daquelas que ainda quero viver. E não importa o quão covarde eu tenha sido ou quão determinado tenha deixado de ser, não perdi o que você me ensinou a ter: paciência.

“Não desiste de mim”, eu disse antes de te dar um último beijo, um último abraço e partir. Meu querer vai além do teu beijo saboroso, do conforto do teu abraço, do teu corpo que eu desejo e da felicidade que me causa ter o teu amor. Meu querer limita-se ainda distante de tudo o que teu caminhar ao meu encontro representa, porque o que eu quero é tão pouco ante o que eu posso que é como te ter a dividir a cama comigo sem roupas e me ser suficiente te fazer um carinho como aquele cafuné que eu sei o quanto você gosta.

“Eu não vou desistir de você”, já estava uns metros distante quando, depois de olhar na sua direção, gritei aquelas palavras e fui o mais firme que pude ao dizê-las. Vi no teu olhar a luta contra o cansaço da espera e uns passos à frente, depois de acometido da esperança de algumas preces, prometi a mim mesmo que aquela seria a última vez que eu tinha olhado pra trás, porque eu só alcançaria você se nunca mais deixasse de olhar pra frente, mas, mais que isso, porque era reconfortante sentir-me novamente como depois de te encontrar: vivo.

Não olhar pra trás era como a última pétala da rosa. Uma dor necessária pra se fazer novamente florescer na primavera. E assim eu nunca soube se você foi vencido pelo cansaço ou caminha mais uma vez na minha direção porque lutou contra ele e venceu. Eu não sei se o amor que viciou tua impermanência sentimental conseguiu te fazer permanecer no mesmo caminho pra que na próxima primavera eu possa te encontrar – porque, até lá, tem esse mormaço do verão, a triste melancolia do outono e aquela solidão do inverno a enfrentar.

Por mais que eu deseje intensamente ter tua companhia em qualquer caminhar, dessa vez eu não posso porque, além do nosso encontro ser pra mim a linha de chegada, eu preciso atravessar todas as estações sozinho. Mas, enquanto eu precisei escolher entre me acovardar e perder ou arriscar e ganhar, você teve uma terceira opção que, sabendo agora da existência dela, me fez apressar o passo ao mesmo tempo que minha voz tenta se fazer canto – na tentativa de te alcançar antes que, ainda que não desista de mim, você desista de me esperar.

My heart would break without you, esbravejo antes de baixar o tom de voz como se acometido da vergonha de dizer em seguida que meu coração poderia não acordar mais sem você. Não há como escapar da vergonha quando se teme ser abandonado por quem abandonamos, afinal por que temor se havia consciência de todas as renúncias envolvidas nas escolhas? Você sabe o quanto de mim se perdeu nesses tempos, então há de entender meus motivos. I’m sorry, and I love you, eu levanto a voz novamente porque eu quero que o mundo saiba do meu amor.

Sem olhar pra trás, não sei do que preveni meu coração de sentir. Tenho sede e o calor que o verão trouxe nada se assemelha àquele provocado pela tua presença. A melancolia que virá no outono terá em meu mundo de dentro sua origem e, durante a solidão do inverno, será meu cobertor junto a momentos de satisfação, erros, acertos, qualidades, defeitos e outros opostos que coexistem e me dão equilíbrio. Se olhando pra frente o caminho já me soa dolorido, talvez seja mesmo aconselhável prevenir meu coração de sentir o que os olhos não puderam ver.

I’ll keep on searching for a answer, meu tom de voz alteou novamente depois que sinos e blues misturaram-se à minha canção. Eu continuo procurando respostas para uma infinidade de perguntas, algumas sobre mim, muitas sobre você, algumas muitas sobre nós. Mas, enquanto sigo caminhando na sua direção – ansioso para, se não te perceber seguido na minha também, o cansaço ter vencido apenas pela inércia dos teus passos e não por te fazer desistir de ser minha linha de chegada e me esperar – uma única resposta me é suficiente.

Uma única resposta é o que faz dos meus sonhos passíveis de tornarem-se reais; um único porquê se sobressai a outros inúmeros porquês e, desde o momento em que me vi amando você, entendi que foi esse amor o motivo que meu coração encontrou pra não parar de bater. Cause I need you more than dope, I need you more than dope, e repito quantas outras vezes forem necessárias para que você me escute. “Não desiste de mim, I need you more than dope”, eu talvez não acordasse se tivesse dito essas palavras ainda em sonho. Mas acordei.

E eu te digo agora, acordado: só consegui me enxergar como futuro quando você assim me enxergou; pelo silêncio de outrora aprendi que valor dar às tuas palavras e, principalmente, o quanto você conversava muito mais com meus olhos que suprindo minha carência auditiva. Eu te amo, nunca me canso em dizer e, mais ainda agora, deixei no caminho a música e fiz dessa declaração o mantra que quero fazer escutar tão logo seja possível te alcançar os ouvidos. Eu te amo e muito me conforta que teu coração tenha também escolhido me amar.

Daqui um tempo é outono. Breve virá também o inverno. E quando chegar finalmente a primavera, sementes germinadas florescendo em florestas, quintais e outros jardins, espero que teu querer seja ainda como quando você partiu, que teu amor tenha permanecido como quando eu me calei e àquela rosa você se agarrou pra vencer todos os obstáculos e todas as dificuldades que as estações do ano te fizeram passar na estrada reta que tinha a mim como destino, mesmo quando eu mesmo não tinha destino algum.

Quando vier a primavera, eu espero, minhas mãos vão encontrar novamente as suas, dessa vez sem despedidas para seguirmos por caminhos opostos. Na próxima primavera, se você não desistir do nosso encontro, seguiremos juntos de forma a fazermos do outro o futuro mais lindo que sequer imaginávamos ter – eu já me conformara com o fato de morrer sozinho e era sozinho que você acreditava ser melhor viver. Você se surpreendeu quando deu conta de que estava a me amar. E eu me surpreendi com seu amor.

“Eu te amo”, sigo repetindo enquanto caminho na sua direção. Por enquanto eu realmente só posso dizer alguma coisa, ainda que você não me escute. Mas, assim que a primavera se fizer pela primeira vez uma estação nossa, sem ser de um ou d'outro, mas de nós dois, será também momento de deixarmos as palavras de lado e fazer dos corpos nosso meio de comunicação. Se realmente nos encontramos ao findar o inverno, ainda que tanto tenha me pedido pra dizer algo, não é pela voz que esse algo será dito de forma que convença sua permanência.

Ainda tenho tempo, não se preocupe. Confie nas minhas palavras e não desista de mim. Quando vier a primavera, mais do que precisar - mais que necessidade, mais que qualquer coisa - é o quanto quero - e vou - te dizer do meu amor de um jeito que só teus olhos possam escutar. Você me faz sentir vivo. E o que me move na sua direção é saber que, sim, nós podemos juntos viver.