sábado, 22 de agosto de 2015

Carta a um sem caráter


Você é mentiroso. Nem chega a ver o que quer e enxerga a direção dos teus olhos com um véu onde projeta sua própria vergonha - por ser e sentir-se como um verme - sobre aquilo que lhe causa inveja. Corrompe os limites intrínsecos às primeiras impressões porque acha que consegue ser contagioso o bastante para se fazer um herói às custas de batalhas alheias, que dizem respeito única e exclusivamente àqueles que delas fazem parte. Você poderia transformar em livros suas histórias, mas prefere fazer sucesso baseando-se em fatos reais que nunca aconteceram de verdade. E você sabe disso. Você mente. Não há caráter na mentira.

Você é falso. Não como todos precisam ser no dia-a-dia pelas regras da boa convivência. Você não zela pelas regras da boa convivência, diga-se de passagem. Você usurpa delas como mecanismo para expressar saudades, reações e quaisquer outros artifícios capazes de lhe assegurar empatia e para que outros se assegurem à sincera, prestativa e confiante pessoa que você insiste em tentar parecer. Você tenta, mas a mim nunca enganou. Se não tivessem sido as experiências que vivi seriam os avisos que recebi. É que outros também sabem disso: você é falso. Não há caráter na falsidade.

Você é desonesto. Se aproveita de qualquer um que parecer mais vulnerável que você – o que por vezes é bem difícil, afinal essa autoconfiança que você exala é tipo perfume cujo cheiro só dura o tempo suficiente para que o comprador seja ludibriado sem perceber. Você se expõe acreditando ser capaz de chocar os alheios aos seus pensamentos, no entanto guarda pra si todas as inseguranças que te atormentam, porque no seu mundo perfeito foder é mais importante que amar – entendível para alguém que, além de não ser mais amado, não se ama. Ninguém te ama mais porque você não foi honesto quando te deram amor. Você é desonesto, oras. E não há caráter na desonestidade.

Você é estúpido. Usa a estupidez como forma de ataque, mas insiste em tentar justificá-la como mecanismo de defesa ante aqueles que você acusa de te julgarem inferior. No entanto ela não é nem um nem outro. Ser estúpido faz parte da sua essência, tal qual aqueles ingredientes insubstituíveis de uma receita, afinal você não é você se não for estúpido. Foi a sua estupidez que me chamou atenção tão logo nos conhecemos. Ninguém precisa agradar ninguém, mas ninguém também tem o direito de fazer teatro com aquilo que desagrada no outro. Ninguém – exceto pessoas de um tipo como o seu – gosta de ser plateia da humilhação alheia. Você humilha o outro para fazê-lo parecer menor que você, fingindo não perceber que isso te faz estúpido. E não há caráter na estupidez.

Você é preconceituoso. Enche a boca de palavras de repúdio enquanto aponta o dedo para todos aqueles que acredita estarem encarando o mundo mascarados, como se acima do pescoço sua pele fosse tão limpa quanto a alma de um recém-nascido. Você talvez tenha esquecido que no decorrer dos anos era preciso cuidar de si mesmo, purificar-se e dar mais atenção àquilo que lhe dizia respeito. Era preciso enveredar por caminhos em busca do seu próprio bem-estar, não envaidar-se por acreditar que ser diferente é sinônimo de ser melhor. Você não é melhor que ninguém. Não esqueça: não há como nos sabermos melhor que algo que não vivemos ou sequer conhecemos - como a vida de uma outra pessoa. É feio julgar o desconhecido. Isso é preconceito. Não há caráter no preconceito.

Você é mau-caráter, todos sabemos: você, eu, quem não te ama mais e, pode ter certeza, quem quer que venha te amar um pouquinho vai logo perceber. Talvez tenham esquecido de te avisar no começo do caminho: esse “mau” é sinônimo de “sem”, porque o caráter não permuta entre o bem e o mal. Tem pessoas que tem e tem pessoas que não tem. Felizmente estas últimas estão em quantidade inferior, porque gente como você, com o passar do tempo, passa a não mais existir – pode demorar muito, mas me conforta saber que antes tarde do que nunca. Não há caráter em você. Ele foi embora junto com aquela alma que partiu e te fez existir como uma desimportante carcaça, parasita inescrupuloso e carente de extinção.

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