sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Quando os opostos se completam


Foi então que eu descobri a verdade por trás daquela velha história de que os opostos se atraem. Já faz um tempo que eu descobri isso, mas só hoje me dei conta de que há tempos não te escrevo algumas poucas palavras. Quer dizer, trocamos mensagens diariamente, nos encontramos esses dias, mas tem meses que não te envio um e-mail e anos que não te escrevo uma carta. Escolhi o primeiro porque tenho essa necessidade da urgência, mais da sua leitura que de alguma resposta. Então hoje eu nem te vi partir como alguns meses ou anos atrás e fiquei, mais uma vez, me agarrando aos devaneios sobre a nossa história.

Eu sempre fui tagarela, é verdade. Só que falar de sentimento sempre foi uma coisa que eu fiz mais bêbado que sóbrio. E quantas vezes eu me entreguei ao álcool antes de abrir a boca, porque sabia que sem ele ficaria de lábios cerrados. Mas eu encontrei na escrita o meu modo de falar sem precisar da voz. E talvez eu não tivesse tido um melhor amigo; ou a casa de outro alguém para ir; ou talvez nem tivesse começado um curso de inglês ou recebido certificado do outro de computação; talvez eu não tivesse aberto o coração a mais ninguém não fosse quando o abri pela primeira vez naquelas páginas de caderno e fichário que trocávamos nos tempos da escola.

Pensando sobre isso, percebi o quanto éramos covardes. É, éramos covardes no fim das contas. Conseguíamos escrever pro outro todas aquelas bobagens – que, à época, eram a coisa mais séria de nossas vidas – mas raramente conversávamos olho no olho, mesmo quando já tínhamos idade suficiente para fazê-lo. Éramos covardes, afinal. Mas éramos dois covardes juntos. E fomos assim até precisarmos nos despedir. Hoje eu lembro daquela viagem em que nos tornamos membros de uma mesma família sem laços de sangue, e percebo que sua chatice e minha carência eram nada mais que consequência de não sabermos lidar com aquela experiência de precisarmos nos relacionar além do papel, de sermos obrigados a lidar com o outro na vida real.

Lembro do que considero um dos momentos mais incríveis na minha vida: dois anos e meio que você tinha partido, férias do meio do ano, eu e você dividindo a primeira madrugada só nossa de tantas que viriam nos anos seguintes. Aqui, na minha memória, é essa a lembrança do que eu considero nossa primeira conversa olho no olho, sem tinta de caneta para encorajar o desabafo. E é engraçado porque, passados quase dez anos daquela madrugada, ainda temos em comum um pouco daquela dificuldade em conversar algumas coisas pessoalmente. É engraçado porque, no fim das contas, o fato de termos demorado tanto para encarar as verdades olho no olho fez com que tivéssemos mais tempo para observar e conhecer o outro.

Conhecemos o jeito de escrever e conseguimos até decifrar o humor do outro só pela forma como respondemos uma mensagem de bom dia. Sabemos mais ou menos a distância exata daquele olhar distante do outro enquanto tomamos sorvete na praça. Podemos, quase que instantaneamente, ler a mente e declarar as mesmas palavras que o outro só pela troca de olhares. São essas algumas poucas razões do que está por trás da história de que os opostos se atraem, sabe? Enquanto teu silêncio atraía minha tagarelice, minha emoção tua racionalidade, teu receio a minha intensidade ou meus sonhos a tua realidade, nós queríamos completar o que nos faltava ao invés de esnobar o que sobrava no outro. Não é que os opostos se atraiam e pronto, sabe? É preciso que se completem. E a gente se completou. A gente se completa.

A distância, contrariando o pensamento comum e dando fim às nossas dúvidas pré-concebidas, não fez papel de rival e foi a principal aliada nessa história de amor entre um homem e uma mulher que nunca encostaram os lábios – a não ser nas vezes em que fizemos pose para foto ou brincamos durante uma bebedeira – e são incapazes de ter qualquer pensamento impuro um pelo outro. Há quinze anos éramos dois covardes aprendendo, juntos, a se fortalecer. Há doze anos somos opostos que se atraem à distância, mas se completam na presença um do outro. Há dez demos início a esse processo eterno de conhecer o outro enquanto conhecendo a nós mesmos. E tem seis que eu consegui controlar a ansiedade porque precisava te dizer algumas palavras e só o podia fazer te olhando nos olhos.

Já perdi a conta de quantas vezes nos despedimos e em quantas dessas despedidas meus desejos de boa viagem foram acompanhados de pedidos de desculpas e agradecimentos. Não lembro da última vez que choramos juntos no aeroporto, mas sei o quanto é no outro que nos agarramos em alguns momentos que parecem impossíveis de suportar. Hoje nós nos despedimos e deixamos na lembrança os bons momentos vividos e as expectativas pelo próximo encontro. E do mesmo jeito que meu excesso emocional não te cansa a alma, o teu silêncio nunca me fez sentir desmerecido. Ele só faz com que cada palavra sua, hoje muito além do papel, tenha ainda mais importância do que você imagina ao falar. Assim a gente se atrai. E assim a gente se completa.

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